Num momento de reflexão, deparei-me
com o seguinte questionamento: de que forma é possível ver a vida através de
uma perspectiva cinematográfica?
Ao relembrar o passado, pode-se, com
algum esforço, fazer recortes das situações vividas e, como num filme, escolher
a fotografia e a trilha sonora, pois o roteiro já foi escrito, os atores
determinados e os papéis destes, interpretados. Dessa forma, dar uma conotação
cinematográfica ao passado nada mais é que deixar a emoção preencher as
recordações e dar origem a uma memória afetiva do que se viveu.
Por outro lado, ao imaginar o futuro,
obtêm-se uma idealização sobre o que pode ou não acontecer. O futuro ideal
funciona como um esboço de um filme, onde você é o produtor, diretor, roteirista
e até mesmo ator, tendo controle total sobre as ações. Nesta idealização,
escolhe-se a dedo a fotografia, os melhores planos, o enquadramento e a trilha
sonora, pois nada ainda aconteceu de fato.
O presente, diferentemente, é a
filmagem em tempo real, sem tempo para ensaios, cortes ou edições, onde não há
controle pleno dos acontecimentos. Estes são vividos visceralmente, sem o poder
afetivo da memória nem a fluidez onírica de uma projeção futura. É neste tempo
presente que há a possibilidade de pôr em prática uma idealização anterior e
transformar em boa recordação o que se vive. Momento crucial de escolhas, ele
funciona como o fiel da balança entre passado e futuro, com a capacidade de
determinar o rumo da vida.
Apesar de dividida em três tempos, a
vida é um segmento único, um continuum.
Ela não funciona como uma colagem desordenada de pedaços para compor um todo.
Na montagem da película que é a vida, cada instante é fundamental, pois
possui a capacidade de influenciar o que virá a seguir. E é nessa sequência da
realidade cotidiana que reside o maior desafio do cineasta-protagonista: sem a
mais bela fotografia e uma trilha sonora ao fundo, realizar sua obra-prima.